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O homem de giz, de C. J. Tudor

17 agosto 2018


O homem de giz é um thriller escrito pela inglesa C. J. Tudor e publicado em 2018 no Brasil pela editora Intrínseca. Talvez você, caro leitor, já tenha ouvido falar desse título – que foi bastante elogiado pela crítica e até comparado a obras de escritores renomados do gênero como Stephen King e Jo Nesbo, tamanho o hype –; ou talvez tenha se deparado com ele na prateleira de uma livraria – seu trabalho gráfico, muito bem feito, realmente chama a atenção. A questão é, vale a pena ler O homem de giz

A história se passa em Anderbury, uma cidadezinha do interior da Inglaterra, e é narrada por Ed, um professor quarentão e amargurado que sofreu alguns eventos bastante traumatizantes em sua vida. Por mais que tente escapar do passado, Ed se vê perseguido por uma verdadeira história de terror que começou na sua infância mas não acabou ali. É a história dos homens de giz

Nosso protagonista alterna sua narrativa em dois tempos distintos: 1986 (passado) e 2016 (algo próximo do presente), tentando explicar as marcas que o assombravam. Acontece que da mesma maneira que as duas épocas se desenvolvem no livro paralelamente, é como se os problemas de Ed também assim caminhassem. 

Em 1986, ele ainda era uma criança qualquer que perambulava pela vizinhança com seu grupo de amigos – de um jeitinho bem Stranger Things –, desenhando homens-palito com giz, sem que isso significasse grande coisa. Tanto ele quanto seus amigos, alguns mais do que outros, viviam situações de família um pouco complicadas, problemas que vão de bullying até fanatismo religioso, e até aí nada de anormal... até que se inicia uma série de eventos estranhos, começando com um grande acidente e culminando em um crime perturbador. Em todas as situações, a desgraça é sempre precedida de desenhos bizarros de homens de giz.

Em 2016, Ed já é professor do ensino fundamental há uns bons anos, naquela mesma cidadezinha. Ele se tornou um sujeito deprimente, entediante e insatisfeito, que desconta as mágoas no alcoolismo e ainda parece muito marcado pelas desventuras que mancharam a sua infância. Quando recebe anonimamente uma carta contendo o desenho de um homem de giz enforcado, Ed se vê obrigado a se reunir com seus amigos daquela época e trazer à tona todo o trauma que compartilharam. Ele logo vai perceber que o pesadelo de seu passado está um tanto longe de ter fim.


Ficha Técnica:
Título: O homem de giz | Autor: C. J. Tudor | Ano: 2018 | Páginas: 272 | Idioma: português Tradução: Alexandre Raposo Editora: Intrínseca

O homem de giz tem a qualidade de prender o seu leitor pela narrativa, mesmo quando o enredo não soa inédito e algumas das reviravoltas não são tão imprevisíveis quanto poderiam ser. A maneira com que a história é conduzida, a escrita fluida com o ritmo adequado dado ao suspense e a sequência infinita de pequenas situações perturbadoras que acometem os personagens – isso cria uma forte sensação de ansiedade que é o bastante para que você não queira largar o livro antes de terminar. O sentimento de "vou ser obrigada a ler o próximo capítulo e entender o que diabos aconteceu depois disso" é frequente, e nesse sentido devo tirar o chapéu para a estreia de C. J. Tudor. 

Por outro lado, a autora peca na construção dos personagens: achei todos muito rasos e mal-desenvolvidos, o que distancia o leitor deles e faz com que ele se torne por vezes apático às suas dificuldades. Um livro que trabalha com um narrador não-confiável, compartilhando memórias que podem ou não ter sido deturpadas por ele, poderia – deveria – explorar melhor o potencial desse protagonista, que acabou sendo muito bidimensional e pouco humano. Todavia, a pior falha nesse sentido é que os demais participantes da história, como os amigos de Ed, por vezes parecem estar ali para cumprir com determinada função, amarrar uma ponta aqui e ali e nada mais. Outro defeito está justamente nas pontas que ficaram soltas, um uso abusivo das coincidências para explicar o inexplicável, algo que acaba ferindo o enredo.

Colocando na balança as qualidades e defeitos d'O homem de giz, eu diria que é um livro que funciona bem para entreter no momento, mas não vai muito além disso: não espere grandes reflexões ou aquela sensação de que você não consegue parar de pensar na história mesmo dias depois de terminá-la. Acredito que fãs do gênero vão curtir a narrativa, que soa como uma homenagem à Stephen King, muito claramente bebendo da fonte de It – anos 80, cidade pequena, crianças meio esquisitas (incluindo uma garota ruiva que sofre abuso doméstico), acontecimentos bizarros, onde foi que eu vi isso mesmo? –, o que não tira o mérito da autora. Para mim, que não tenho experiência de longa data com thrillers mas gosto de me aventurar em todos os gêneros, foi um livro bom enquanto durou,sem deixar marcas a longo prazo. O homem de giz pode ser lavado da memória do leitor tanto quanto um homem-palito de giz no asfalto.
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